sábado, 31 de maio de 2014

MOMENTO DE POESIA - Pede-me


PEDE-ME
   
  
Pede-me tudo o que quiseres ter.
Queres a lua?
Num céu profundamente azul
Rodeada de estrelas mil,
 Brilhantes,
A lua será tua, meu amor,
A lua dos amantes

 
Queres o sol?
Envolto em neblina
Para teus olhos proteger,
Sobre um glorioso mar,
De brancas ondas de espuma,
Para o teu corpo dourar
O sol será teu, meu amor.
O sol te vou ofertar
Queres a floresta?
Os rios?
O mar?
O céu azul em festa?
 Um corcel alado montarei
Por entre as nuvens voarei,
Numa bandeja de prata
O céu azul colocarei
E a teus pés o deporei.

Tudo o que quiseres ter
Meu amor
Eu te darei

 Pede-me tudo o que quiseres ter.
Só não me peças para te esquecer.

Mariazita

quarta-feira, 14 de maio de 2014

SAUDOSA ÁFRICA DISTANTE - CABO VERDE

CHEGADA À “LUA”
… e três meses depois da chegada ao Continente, regressados de Moçambique, embarcamos rumo a Cabo Verde.
Após uma viagem num “mar de azeite”, como dizem os marinheiros,
 

aproximamo-nos do nosso destino.
Ao longe, apenas se vislumbravam umas sombras esfumadas no horizonte.
Agora, que estamos relativamente perto, a paisagem torna-se nítida – montes escalvados, de cor avermelhada, sem vestígios de vegetação… uma verdadeira paisagem lunar.
Temos a sensação de que estamos a chegar à lua!

 Depois das manobras habituais, que nos parecem infindáveis, o navio encosta ao cais.
Com a bagagem de camarote há muito preparada e as três crianças controladas, apressamo-nos a descer o portaló.
O cais fervilha de gente, na sua maioria naturais da terra, táxis buzinando, um burburinho tremendo.
Finalmente pomos pé em terra.
Após beijos e abraços efusivos - que as saudades já eram muitas – aguardamos o carro que nos transportará para casa.

Ao meu lado um autóctone vê, de repente, um carro passar muito perto, chegando mesmo a roçar-lhe o corpo. Recuando de um salto, com receio de que o pneu lhe passe por cima do pé descalço, grita, assustado:- Ai nha pé!
Este é o meu primeiro contacto com a linguagem local, o crioulo cabo-verdiano.
 O “nha”, que significa meu ou minha (nha pai, nha mãe) irá fazer parte do meu dia-a-dia durante os próximos dois anos.
Vamos então p’ra nha casa!
 
Situada num ponto elevado, a moradia, acompanhada à esquerda e à direita por outras casas igualmente independentes, tem na parte da frente um arremedo de jardim, com uma ou outra planta enfezada, que, durante os dois anos da minha permanência aqui, irei, teimosamente, tentar recuperar.
Luta inglória! O ar é extremamente seco, com ventos fortes nove meses por ano, a falta de água é enorme; mesmo regando-a todos os dias, a terra absorve completamente a água muito para além de onde as raízes a possam alcançar.
Apesar de todos os esforços, o meu jardim nunca deixará de ter este aspecto desértico.
Mas, por agora, há que nos instalarmos na que vai ser a nossa moradia durante os próximos dois anos.
Não se trata de nenhum palácio, mas, depois de arrumada a nosso gosto, ornamentada com alguns objectos que nos acompanharam, torna-se bastante confortável.
Da porta de casa, à qual se acede subindo três degraus de pedra, depois de atravessar o “jardim”, avista-se, não muito ao longe, o mar, vindo do qual se pode sentir, em certos dias, o cheiro a maresia.
 
Em frente, do lado de lá da estrada, há um vasto espaço coberto de terra vermelha, que termina num declive em direcção ao mar.
Algum tempo depois de aqui estar irei assistir a verdadeiras batalhas campais travadas entre grupos de cães, provavelmente inimigos, nesse espaço existente em frente à casa.
Sem qualquer aviso prévio, uns chegam da direita, outros aproximam-se pela esquerda, acabando por encontrar-se frente a frente, no centro do terreno.
Entre ladridos e rosnares, engalfinham-se ferozmente, levantando incríveis nuvens de poeira vermelha que chega a escurecer o céu.
Depois de alguns minutos de luta abandonam o campo de batalha, retrocedendo cada grupo pelo mesmo caminho por onde chegara.
Da refrega, felizmente, não resultam mortos; apenas alguns ferimentos se revelam nas pernas que vão manquitando no regresso ao lar.
Nunca conseguirei descobrir por que razão, de tempos a tempos, se envolvem em contenda.
Certo é que, chegará o dia em que também eu regressarei ao local de partida, sem que eles tenham resolvido os seus diferendos.
 
 
Nada faz prever que aqui se venha a desenvolver alguma guerra, tão pouco qualquer convulsão social.
Tudo leva a crer que os dois anos que vamos permanecer por cá serão passados em perfeita e serena paz, perspectiva por demais atraente para quem viveu os últimos cinco anos em Angola e Moçambique, em clima de guerra, num constante sobressalto, que não nos deixava prever o dia de amanhã.
Temos esperança de que a permanência nestas terras crioulas nos traga a tranquilidade de espírito de que tanto necessitamos.
 
 
 
(Excerto do primeiro capítulo da terceira parte do livro que estou escrevendo.)