domingo, 30 de maio de 2010

SENTIDO INVERSO

SENTIDO INVERSO
Segunda parte

Os pais dela trabalhavam, ela não tinha irmãos, portanto a casa estava por nossa conta.
Começámos a estudar na sala



mas, pouco tempo depois, ela propôs que descansássemos um pouco e fôssemos para o seu quarto ver fotos ou qualquer outra coisa que agora não recordo; não fiz qualquer objecção . Fomos!
Aí chegadas a minha amiga começou a queixar-se com calor, dizendo que ia pôr-se à vontade, e insistindo para que eu fizesse o mesmo. Tudo bem, porque não?
Ficamos, portanto, apenas com as calcinhas e os sutiãs.
Sentámo-nos na beira da cama a ver qualquer coisa, e de repente, sem eu esperar, ela, com a mão direita puxou-me pelo pescoço e deu-me um beijo na boca, ao mesmo tempo que, com a mão esquerda, acariciava a minha coxa.
Qualquer coisa em mim entrou em alerta! Eu nunca havia tido qualquer contacto mais íntimo, e em casa os meus pais eram bastante discretos, embora muitas vezes trocassem carinhos.
Penso que a minha sexualidade ainda não tinha despertado, o que só viria a acontecer, na prática e fisicamente, depois dos dezoito anos.
Naquela altura, com a minha amiga, não sei o que senti. Espanto, talvez.



A verdade é que eu era, com certeza, muito infantil, e com a educação algo severa dos meus pais, não tinha ainda tido devaneios amorosos…
A minha reacção foi, portanto, afastar-me um pouco; mas ela puxou-me carinhosamente para si e começou a beijar-me o pescoço ao mesmo tempo que tentava acariciar-me o peito, que já se notava perfeitamente, denotando o que viria a ser dentro de pouco tempo.

Fui salva pelo gongo, como se costuma dizer. O telefone começou a tocar e a minha amiga foi à sala atender. Eu aproveitei para rapidamente me vestir, e quando ela regressou disse-lhe que era melhor ir-me embora porque não avisara a minha Mãe de que ia chegar mais tarde e “sabes como ela é exigente com os horários”. (A minha Mãe trabalhava em casa como tradutora, por isso quando eu saía da escola encontrava-a sempre em casa).

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A minha amiga mostrou-se muito compreensiva e não insistiu para eu ficar; apenas me disse que gostava que eu fosse novamente estudar com ela, mas que avisasse disso a minha Mãe.

Saí dali com as pernas a tremer. Tinha a sensação de que o que se passara não era tão inocente como a minha amiga me queria fazer crer. O meu sistema de alerta funcionara na perfeição, evitando que eu pudesse ter a minha primeira experiência homossexual, para a qual não estava minimamente preparada, e que poderia ser bastante traumatizante.

Ela ainda voltou a convidar-me meia dúzia de vezes para ir a sua casa; mas, perante as minhas escusas, acabou por desistir.
Não deixei de ser amiga dessa garota, embora evitasse, daí para o futuro, encontrar-me a sós com ela, e recusasse, sistematicamente, todos os seus convites que implicassem uma maior aproximação.

Nos anos que se seguiram até aos meus 18 anos nada de especial aconteceu no que respeita a experiências sexuais.
Penso que para isso muito contribuiu a educação que a minha Mãe me dava: muito carinho, muito amor, mas muita severidade também. Ela conhecia perfeitamente os meus horários escolares, e não admitia que eu chegasse a casa mais tarde do que o tempo necessário para a deslocação. Para que tal acontecesse, tinha que ser previamente avisada.
À medida que os anos passavam as minhas formas iam-se arredondando, a cintura ficando mais fina e os traços do rosto mais harmoniosos.
Contra isso a minha Mãe nada podia fazer, a não ser comprar-me roupas bastante folgadas, que disfarçavam as minhas elegantes formas.
Fora dos seus olhares eu colocava um cinto que ajustava a roupa à cintura, porque cada dia sentia mais vontade de me libertar daquela maneira de vestir arrapazada. Mas com a minha Mãe não valia a pena insistir: a sua vontade era soberana. E depois ela tinha uma maneira de se impor, uma autoridade tão natural, que eu nem sentia que estava a ser contrariada, mas sim convencida a fazer o que não me agradava.
As amigas, quando a iam visitar e eu aparecia para as cumprimentar, não me poupavam elogios:
- Carminha (era a minha Mãe), mas como a tua filha está bonita! E tão elegante! É uma verdadeira estátua! Só é pena que tenhas tão mau gosto para a vestir… Deve andar uma multidão de rapazes atrás dela…
Já tens namorado? – perguntavam, dirigindo-se a mim.
Eu simplesmente corava e baixava a cabeça; e antes que pronunciasse uma palavra a minha Mãe atalhava logo:
- Era só o que faltava! Ela tem é que pensar em estudar, tirar o seu curso, estabelecer-se na vida, e depois então pensar em namoricos. E ainda vai cedo! Eu casei-me com 28 anos e tenho tido tempo para realizar todos os meus sonhos. Portanto ela fará o mesmo.

Continua

domingo, 23 de maio de 2010

SENTIDO INVERSO


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Quando eu nasci os meus pais não tiveram a alegria que normalmente os pais têm com o nascimento de um filho, isso porque eu era uma filha.

Na realidade eles desejavam que o primeiro filho fosse um rapaz, com o que, provavelmente, encerrariam as actividades de procriação.

Coitados! Tiveram azar, e apareci eu, uma menina, linda, ao que dizem, e como posso comprovar pelas fotografias, não muitas, que me tiraram em criança.

Acabaram por se conformar; não havia mais nada a fazer, a não ser uma outra tentativa para conseguirem um rapaz.

Foram bem sucedidos, e o meu irmão nasceu quando eu já tinha cinco anos. (demoraram um certo tempo a refazer-se e ganhar coragem para nova investida…)

O facto de eu ser uma menina não me prejudicou em nada. Os meus pais trataram-me sempre com o maior carinho e desvelo, e, mesmo depois de o meu irmão nascer, os seus cuidados para comigo não diminuíram. Não passou a haver qualquer diferença de tratamento entre o meu irmão e eu.

Há apenas um pormenor, relativo á minha infância, que me causa um certo desconforto quando o recordo:

A minha Mãe vestia-me sempre com roupas bem arrapazadas – calças ou jardineiras, mas sem aquele toque feminino que geralmente têm estas peças de roupa quando destinadas a meninas, e que se traduz por umas florinhas, ou cãezinhos, ou corações, enfim, qualquer floreado que é colocado no bolso ou no peitilho.

O cabelo andava sempre muito curto. Nada de tranças ou totós, nem mesmo as “palmeirinhas” que todas as meninas usam no topo da cabeça, quando o cabelinho começa a crescer, por volta dos dois anitos, e que as mães enfeitam com vistosos laçarotes.

Recordo-me que isso me causava um certo desgosto. Via as minhas amigas com alegres vestidos rodados, cabelos caindo pelas costas ou apanhados em totós, à “ Pipi das meias altas”, e sentia-me inferiorizada, feia e sem graça.

As amigas da minha mãe às vezes comentavam:

- Credo, tu não tens gosto nenhum para vestir a tua filha. Nunca se lhe vê um vestidinho…parece sempre uma Maria-rapaz!

- Assim é que ela anda bem, pode correr e saltar à vontade sem precisar preocupar-se com as roupas! A Liberdade começa por aí…

As amigas não insistiam porque sabiam que não valia mesmo a pena.

A minha Mãe parecia querer encaminhar-me num sentido inverso àquele para que eu havia nascido – ser Mulher.

Quando fiz 18 anos pude, finalmente, começar a decidir o que vestir.

Comprei um lindo vestido vermelho, todo moderno, bem feminino, que me marcava as formas que Deus, na sua infinita misericórdia, fizera semelhantes às de uma estátua!


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A minha Mãe esboçou um ligeiro esgar ao ver-me aparecer assim vestida na festa que me preparara com todo o esmero. Fiquei na dúvida se era desagrado ou espanto ao ver a filha como nunca a vira antes.

Mas eu estava demasiado feliz para me preocupar com esses pormenores. Foi um dia muito lindo na minha vida, que marcou o início duma grande reviravolta.

Num primeiro gesto de rebeldia comecei logo a deixar crescer o cabelo, e durante um ano a cabeleireira não lhe pôs as mãos.

Quando já me pousava nos ombros passei a deixar que fosse tratado por mãos de profissionais.

E pude, finalmente ser, mas muito especialmente sentir-me, mulher!

Recuando um pouco até à pré-adolescência, altura em que começa a despontar a sexualidade, recordo-me que as meninas andavam pelos cantos aos beijinhos aos rapazes, numa total inocência, mas já revelando o aproximar do desenvolvimento das hormonas.


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Talvez devido aos meus modos arrapazados incentivados pela minha mãe, os rapazes não manifestavam por mim qualquer interesse para além do jogo da bola – eu era sempre integrada numa das suas equipas. Acho que eles me viam como “um dos deles”…

Assim fui crescendo, e quando andava pelos treze anos, em que, se não acontece antes, é altura de despertar a grande curiosidade pelo misterioso sexo, tudo para mim continuava na mesma, pois os rapazes viam-me com os mesmos olhos de sempre, e não denotavam sentir por mim qualquer atracção física.

Foi então que uma amiga começou a insinuar-se mais junto a mim, e um dia convidou-me para ir estudar para casa dela. Fui, contente e feliz.

Lembro-me que era um dia de muito calor.

Continua...

domingo, 16 de maio de 2010

MINHA IDA AO DERMATOLOGISTA


Visita de rotina aos médicos. Todos os anos a mesma peregrinação:
Mastologista, ginecologista, oftalmologista, dentista…
Mas um dia resolvo incluir um ISTA novo na minha odisseia – um DERMATOLOGISTA.

Já era hora de procurar uns creminhos mágicos para tentar retardar ao máximo as marcas da inevitável entrada nos ENTA.
Para ser sincera e nem um pouco modesta, entrei gloriosa nesta seita. Com direito a uma festa memorável, que durou até às 10 horas da manhã do dia seguinte. Festa com música ao vivo, Los Años Dorados, na melhor boite da cidade, todos os amigos, fotografias… tudo maravilhoso.
Na verdade sentia-me espetacular. Tudo certo. Ninguém podia cantar para mim a ridícula frase da Calcanhoto: “nada ficou no seu lugar”...

Mas não sei o que deu no espelho lá de casa, que resolveu, do dia para a noite, tomar ares de conto de fadas. Aliás, de bruxas. E mostrar coisinhas que nunca haviam aparecido. (Ou eu não havia notado?) Pontinhos azuis nos tornozelos, pintinhas negras no colo, nos braços, bolinhas vermelhas na bunda… olheiras mais profundas… Como assim???
Assim...sem avisar nem nada. De repente, o idiota resolveu mostrar e pronto.
Ah, não! Isso não vai ficar assim. ISTA novo na lista do convênio. O melhor. Queria o melhor especialista de todos os ISTAS... Achei. Marquei. E fui tão nervosa quanto para um encontro ‘bem intencionado' daqueles em que a gente escolhe a roupa íntima com cuidado, que é para não fazer feio...nem parecer que foi uma escolha proposital… sabe como é, né?

Pois sim. O sujeito era um dermatologista famoso. Via e futucava a pele de toda a nata feminina e masculina da cidade. Assim, me armei de humildade. Disposta a mostrar cada defeitinho novo que estava observando, através do maquiavélico e ex-amigo espelho de meu quarto. Depois de fazer uma ficha com meus dados, o 'doutor' me olhou, finalmente, nos olhos, e perguntou: 'O que lhe trouxe aqui?'

Fiquei vermelha como um tomate. E muda. Ele sorriu e esperou.
Quase de olhos fechados, desfiei minhas queixas. Ele observou ' in loco' cada uma delas, com uma luz de 200wtz e uma lupa... e começou o seu diagnóstico.

- “As pintinhas são sinais de sol, por todo o sol que já tomou na vida.
Com a IDADE (tóin!) elas vão aparecendo, cada vez mais numerosas. Vai precisar de um protetor solar para sair de casa pela manhã, mesmo sem ir à praia. Para dirigir mesmo. Braços e pernas e rosto e pescoço. “
- E praia?
- “Evite. Só de 6 às 10 da manhã, sob proteção máxima, guarda sol, óculos e chapéu. Bronzear-se, nunca mais!”
- Ahmmm… (a turma só chega às 11:00…!!!)
- “Os pontinhos azuis são pequenos vasos que não suportam a pressão do corpo sobre os saltos altos. Evite. Sapatos com solado anabela ou baixos, de preferência. Compre uma meia elástica, Kendall, para quando tiver que usar os saltos altos”
- Ahmmmaaa… (Kendall??? E as minhas preciosas sandalinhas???)
- “As bolinhas na bunda são normais, por causa do calor. Para evitá-las use mais saias do que calças. Evite o jeans e as calcinhas de Lycra. As de algodão puro são as melhores… e folgadas.”
- Ahmnunght??? (e pude “ver” as de minha mãe, enormes, na cintura, de florzinhas cor de rosa… vou chorar!)
- “As olheiras são de família. Não há muito o que fazer. Use esse creminho à noite, antes de dormir, e procure não dormir tarde. Alimentação leve, com muita fruta e verdura, pouca carne e muito peixe. Nada de tabaco, nem álcool… nem café.”

E a histérica aqui começou a rir…

Agradeci, peguei suas receitinhas, e saí rindo, rindo, me dobrando de tanto rir!

No carro comecei a falar sozinha... tudo o que deveria ter dito e não disse:
Trabalho muito, doutor... muitas noites vou dormir às 2h, escrevendo e lendo. Bebo e fumo. Tomo café. Saio pelas noites de boémia com os amigos e os violões para as serenatas de lua cheia....e que noites!!!

Adoro os saltos, principalmente nas sandálias fininhas. Impossível a meia elástica (argh!!).
Calcinhas de algodão? E folgadas??? Adoro as justinhas e rendadas.. E não abandono meu jeans nem sob ameaça de morte!!! É meu melhor amigo!!!!
Dormir lambuzada? Neste calor? E minhas duchas frias com sabonete Johnson para ficar fresquinha como um bebê, cada noite?
E nada de praia??? O senhor está louco é???? Endoideceu, foi??? Moro em Rio de Janeiro, com esse mar e tudo…e tenho só 50 anos… meia vida inteira pela frente!!!
Doutor Fulustreco, na minha idade não vou viver como se tivesse feito trinta anos em um!!! Até um dia desses tinha 49... e agora em vez de 50 estou fazendo 70???
Inclua aí¬ na sua lista de remédios para as de
50 a 70: MEIA LUZ... Acho que é só disso que eu preciso. Um bom abajour com uma luz de 15wts...E um namorado que use óculos...É isso… só isso!!! Entendeu???

Parei no sinal e olhei de lado... e um garoto de uns 25 anos piscou o olho para mim. Ah... e ele nem usava óculos! Nunca fiz o que me recomendou o fulustreco ISTA... Minhas olheiras são parte de meu charme.
E valem o que faço pelas noites a dentro... ah!!! se valem!
As bolinhas da bunda desapareceram com uma solução caseira de vitamina A, que quase todas as mulheres usavam e eu não sabia, até que contei minha historinha do 'bruxo mau'.
Os sinaizinhos estão aqui... sem grandes alardes... e até que já acho bonitinho.
O espelho é muito menor… o outro, eu dei a minha filha.
E meu namorado diz que estou cada dia mais linda Principalmente quando estou de saltos e rendas, disposta a encarar uma noite de vinhos e música.
É claro que ele usa óculos. Mas quando quero ficar fatal, tiro os seus óculos… e acendo o abat-jour.

ESQUEÇA OS ISTAS E TENHA UMA BOA SEMANA.

domingo, 9 de maio de 2010

SAUDOSA ÁFRICA DISTANTE (1/02)

O INCONVENIENTE DE SE FALAR FRANCÊS

Quando cheguei tinha acontecido, poucos dias antes, a independência do Congo Belga. A cidade estava repleta de refugiados que tinham vindo acolher-se num sítio para eles seguro, dado que, após a independência, o vizinho Congo Belga viveu tempos muito conturbados.
Da varanda do apart-hotel onde eu me encontrava, e onde permaneci por cerca de um mês, podia vê-los, com enormes túnicas brancas contrastando com o negro da pele. Para quem, como eu, não estava habituada a vê-los em tão grande número e em tais roupagens, era um pouco assustador. Quase não me atrevia a sair à rua, a não ser acompanhada, o que só podia acontecer ao final do dia, quando o marido regressava dos seus afazeres.
A primeira semana foi um pouco complicada. O marido encontrava-se destacado numa povoação a alguns quilómetros de distância, e só regressou uma semana depois. Fez-me companhia no dia da chegada e no dia seguinte, mas logo a seguir voltou para o seu posto.
Acho que foi a semana mais comprida da minha vida, mas chegou ao seu termo, como tudo…
Decorrido cerca de um mês conseguimos alugar um apartamento num prédio que ainda estava em construção. O construtor deu prioridade aos dois apartamentos do rés-do-chão – esquerdo e direito – onde se instalaram duas famílias nossas conhecidas, e ao primeiro andar direito, para onde nós fomos viver.
Como o dia em África começa muito cedo, quando dei à luz, às nove horas da manhã, os trabalhos decorriam a ritmo acelerado nos andares de cima. As marteladas ouviam-se a distância e faziam estremecer o prédio. E foi no meio de toda esta algazarra que o meu bebé tomou contacto com o mundo pela primeira vez.
Os dias que se seguiram não foram mais silenciosos; só quando as obras foram subindo de patamar é que o barulho se começou a ouvir mais ao longe.
Ainda hoje me espanta como é que o meu filho consegue ser uma pessoa tão calma e serena tendo nascido no meio de tanta barulheira.
A casa onde morávamos era bastante espaçosa. Para além duma sala grande que funcionava como sala de estar e de jantar, tinha dois quartos, e as restantes divisões normais numa casa.
Cerca de um mês depois de lá estarmos a minha cunhada foi juntar-se a nós,

e aí permaneceu até que o marido, colocado mais ao norte, conseguiu reunir condições para ter a família junto de si. Vinha à cidade apenas aos fins-de-semana gozar a companhia da mulher e dos dois filhitos pequenos.
Tínhamos um criado que passava a ferro e cozinhava divinalmente. Lembro-me que lhe lia receitas do meu livro de cozinha que me tinha acompanhado – inexperiente como eu era não sabia cozinhar e tinha que me valer do livro de receitas, gentil oferta do marido no primeiro Natal que passamos casados !!!
O Francisco, assim se chamava o criado – pelo menos dava por esse nome – ouvia a receita uma vez apenas e reproduzia os cozinhados quantas vezes quiséssemos, com mão de mestre.
Era um homem alto, bonito, de pele excepcionalmente escura, quase azulada, com um semblante impenetrável.
Naturalmente educado, cortês, de poucas falas mas atencioso, levava-nos a pensar que teria ascendência de elite.
Um dia em que eu e minha cunhada nos encontrávamos na sala, cuidando dos bebés, o Francisco encontrava-se lá também, a passar a ferro.
A minha cunhada dirigiu-se-me:
- Mariazita, já reparaste como “ele” passa tão bem a ferro?
Para que ele não percebesse, ela tinha falado em francês, e dito “ele” em vez de “Francisco”.
Já anteriormente tínhamos usado este estratagema quando queríamos dizer alguma coisa que preferíamos que ele não percebesse.
Antes que eu respondesse à minha cunhada, o Francisco disse, em português:
- Aprendi com a minha mãe, senhora. Era ela que cuidava pessoalmente dos fatos do meu pai.
Apanhadas de surpresa, a nossa reacção imediata foi de estranheza, que lhe fizemos sentir:
- Ah! Então o Francisco sabe falar francês?
- Sim, senhora, melhor do que português, porque eu sou do Congo Francês.
Àquela data, depois da independência do Congo Belga e consequentes distúrbios, havia uma atenção especial à fronteira, a norte, com o Congo Francês – Ponta Negra – que viria a tornar-se independente pouco tempo depois.
Postos ao corrente deste “incidente” com o Francisco, devido ao clima instável que se vivia no Congo Francês, os maridos acharam mais prudente “dispensá-lo” do serviço.
Apanhámos um pequeno (…) susto, mas, no fundo, o que mais nos custou foi perdermos os belíssimos cozinhados do Francisco.
E tudo isto por nos termos lembrado de falar em francês!

segunda-feira, 3 de maio de 2010

ALERGIAS

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Alergias! Quem não as tem... Noites sem dormir...com um pacote de lenços de papel na mesinha de cabeceira...
E aqueles momentos em que se dorme profundamente e de repente: "atchiiiim!!" "atchiiim!!" "atchiiiim!!""atchiiiim!!""atchiiiim!!"
No dia seguinte os olhos parecem dois repolhos, de tão inchados que estão, ao mesmo tempo que escorrem água como uma nascente. O nariz completa o cenário – pena que não se lhe possa pôr uma rolha…
É assim que estou, minhas amigas e meus amigos. Por isso não vou poder corresponder, atempadamente, aos vossos amáveis comentários.
Logo que me encontre melhor visitarei todos, um por um.

Um grande beijinho virtual (sem micróbios…)

domingo, 2 de maio de 2010

DIA DA MÃE

"Em geral, as mães, mais que amar os filhos, amam-se nos filhos."
(Friedrich Nietzsche)


MÃES SÓ MORREM QUANDO QUEREM

"Eu tinha 7 anos quando matei minha mãe pela primeira vez.

Eu não a queria junto a mim quando chegasse à escola em meu 1º dia de aula.
Eu me achava forte o suficiente para enfrentar os desafios que a nova vida iria me trazer.
Poucas semanas depois descobri, aliviado, que ela ainda estava lá, pronta para me defender não somente daqueles garotos brutamontes que me ameaçavam, como das dificuldades intransponíveis da tabuada.

Quando fiz 14 anos eu a matei novamente.

Não a queria me impondo regras ou limites, nem que me impedisse de viver a plenitude dos vôos juvenis.
Mas logo no primeiro porre eu felizmente a redescobri viva; foi quando ela não só me curou da ressaca, como impediu que eu levasse uma vergonhosa surra de meu pai.

Aos 18 anos chei que mataria minha mãe definitivamente, sem chances para ressurreição.

Entrara na faculdade,iria morar em república, faria política estudantil, atividades em que a presença materna não cabia em nenhuma hipótese.
Ledo engano: quando me descobri confuso sobre qual rumo seguir voltei à casa materna, único espaço possível de guarida e compreensão.

Aos 23 anos me dei conta de que a morte materna era possível, apenas requeria lentidão...

Foi quando me casei, finquei bandeira de independência e segui viagem.
Mas bastou nascer a primeira filha para descobrir que o bicho mãe se transformara num espécime ainda mais vigoroso chamado avó.
Para quem ainda não viveu a experiência, avó é mãe em dose dupla...
Apesar de tudo continuei acreditando na tese da morte lenta e demorada, e aos poucos fui me sentindo mais distante e autônomo, mesmo que a intervalos regulares ela reaparecesse em minha vida desempenhando papéis importantes e únicos, papéis que somente ela poderia protagonizar...

Mas o final dessa história, ao contrário do que eu sempre imaginei, foi ela quem definiu: quando eu menos esperava, ela decidiu morrer.
Assim, sem mais nem menos, sem pedir licença ou permissão, sem data marcada ou ocasião para despedida.
Ela simplesmente se foi, deixando a lição de que “mães são para sempre”.

Ao contrário do que sempre imaginei, são elas que decidem o quanto esta eternidade pode durar em vida, e o quanto fica relegado para o etéreo terreno da saudade..

Desconheço a autoria

Não espere pela partida da sua Mãe para lhe dar Amor.
Se a tiver ainda ao seu lado, dê-lhe um beijo e um abraço e diga-lhe o que ela mais gosta de ouvir:
ADORO-TE, MÃE. OBRIGADA POR EXISTIRES!

E se ela já não estiver ao seu lado, se já tiver partido...
Feche os olhos e faça uma prece em seu louvor, agradecendo-lhe pela vida que lhe deu. Pode também dizer que a ama, porque onde ela se encontra vai escutar o que você lhe está dizendo... e vai sentir-se muito feliz.